domingo, 22 de janeiro de 2012

gosto não se discute, saboreia-se.

Gosto: cada um tem o seu, é igual nariz, diriam uns. É igual cu, diriam outros. Narizes e cus à parte, se tem uma coisa que eu acho curiosa - e linda - é ver como o encanto (e não o amor, que tô sem força pra falar dele) vem de coisas incríveis. A gata da minha sócia tem um texto lindo que fala sobre o tal moço o jeito que ele bebia. Não temos brédês pites, nem jonis dépis na nossa vida, mas tem aquela coisa mais ou menos que, de algum jeito ou outro, encanta. A clavícula, por exemplo. Ninguém nunca entende minha paixão por clavículas. Clavículas são as partes mais interessantes de um homem, e um homem sem belas clavículas não pode ser passível de paixão. Ossos, em geral. Ilíaco à parte, dado o consenso, maxilares, costelas e esterno. Sorte daquela que se depara com um esterno saliente. Ah, o esterno saliente! Pra mim, é claro...

Lembro de um rapaz que era encantado pelo meu pé. Não só por ser um pé, mas por ser um pé 41. Vai entender...
A gente se apaixona pela pessoa como um todo, mas o encanto vem em partes. O homem que corta a pizza, por exemplo. Freudianos me perdoem que não quero discutir o édipo incutido nisso, mas nada mais interessante que o homem que corta a pizza, que pede a cerveja, mas que não abre a porta do carro. Vai entender, é complicado agradar. Pior ainda agradar uma pessoa mimada mesclada com pseudo independente. 

É estranho gostar de clavículas, mas já conheci uma pessoa que se apaixonava por lóbulos. Fetiche por orelha, quem vai julgar? Faço parte de um clã feminino que não resiste a um nariz grande, e que vai desanimar quando a mão do moço é pequena. Mas sei das que gostam de quem tem a nuca mais longa, e o moço que adora uma batata da perna gordinha. 

Quase todos os homens gostam de covinha nas costas, mas poucos sabem apreciar uma mancha na pupila e um nariz que mexe quando se fala. Alguns odeiam maquiagem, outros adoram ver a menina se maquiar. Já ouvi rumores de tesão em mulher segurando curvex - não discuti. E sardinhas? E pintinhas? e aquela pinta específica, que só ele, ou ela, acha bonitinha.

Mulher de roupão, de camisa, de cinta-liga. Mulher de moleton. Homem de havaianas, homem de meia branca, homem de avental. Ai, os jalecos. E o jeito que ela segura o copo, ou o jeito que ele fuma. O batom vermelho que sobra no guardanapo.

Às vezes a gente não precisa se fantasiar de enfermeira para agradar, às vezes só aquele óculos velho que você usa pra ver filme serve de fetiche. E que bom que é assim. Vamos saborear..


Mas há rumores que minha sócia tá louca por um moço que apareça de coturnos. E só de coturnos.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Ficção, fictividade, fictício

Posso estar incorrendo no maior erro da minha vida, parar meu trabalho para a disciplina do mestrado (que trata, justamente, de ficção) por constatar que até os temas mais difíceis da teoria literária estão absolutamente ligados a essa coisa cruel e divertida que a gente chama de vida. Ficcionalizar é natural e necessário para o ser humano, teríamos, de acordo com uma grande autora que eu tenho a honra de chamar de orientadora, a pulsão de ficção, isto é, uma tendência pessoal inata de ficcionalizar para suportar alguns chatos obstáculos ou potencializar prazeres. Quem escreve, eleva e escancara isso, de uma forma ou de outra. Mas não há relacionamento sem ficção, qualquer ele que seja, do mais impessoal ao mais profundo romance. Ficcionalizamos o primeiro beijo, o motivo pelo qual ele não apareceu, as razões pela qual ela/ele prefere daquele jeito ou daquele outro. Criamos situações imaginárias, projetamos imagens, boas ou más, seja para sustentar uma paixão, seja para, justamente o contrário, evitar que nos apaixonemos. Agora mesmo li que o mal do século XX é o vício de ficcionalizar a realidade. É uma fuga desesperada e eu sei que vocês ficam pensando agora no que é que eu pensei para querer escrever tudo isso. E vocês não podem imaginar como eu crio situações imaginárias a cada segundo, a cada pessoa, em cada sorriso. E, não, não é porque sou mulher, porque homens - ainda que quase não partilhem - também são mestres da ficção. Alguns fazem disso charme, outros, a pior qualidade. Eu só tenho pena de quem não pode e não sabe aproveitar esse dom naturalmente humano de imaginar, que a vida assim, crua e com pintura original, tem tão menos graça do que quando a gente pinta com as nossas cores.

e Deus permita que esse textículo, com x, nunca caia nas mãos do meu professor.